2007-06-29

A arte do elogio

Entre muitas das minhas incapacidades, a dificuldade da prática do elogio é uma das que mais se salienta. Não me é fácil elogiar. Não me é fácil tecer louvor em reconhecimento de outrém, verbalizar admiração pela realização daquilo que não seja "absolutamente extraordinário".

Não estou a falar do elogio gratuito ou banal, ou da adulação interesseira. Estou a falar do reconhecimento sincero que nos faz aplaudir, entusiasmar e transmitir esse nosso reconhecimento aos outros.


Alguém dizia que apenas quando elogiamos tornamo-nos merecedores de exercer crítica. Talvez assim seja. Gosto no entanto de pensar, que aquilo que poderá ser importante neste processo seja acima de tudo o "falar verdade". E este é o busílis da questão. O exercício da verdade no elogio!

Como a prática do elogio é um importante factor motivador, encorajador e de estímulo, esta tem sido uma batalha que procuro não perder.

Ao procurar alguma das razões para esta dificuldade tenho isolado uma: a distracção! Não uma desculpa, mas uma real constatação!

Sou particularmente distraído. Sou particularmente desatento aos pormenores que dão consistência, que pela sua realização trazem ordem, que produzem harmonia e conforto. Talvez uma atenção redobrada ao esforço, à dedicação ou à simples verificação das realizações dos outros, permitiria facilitar o fluir do elogio. Mas tal exige disciplina. Mas como além de distraído sou indisciplinado, então a coisa realmente complica-se...


Um último apontamento. Etimologicamente, a palavra elogio deriva da palavra latina elogium, que significa epitáfio ou inscrição tumular. Talvez seja por isso mesmo que é tão fácil elogiar na morte e tão difícil fazê-lo em vida! Mas qual será mais importante? As palavras expressas e acolhidas no coração daqueles que são objecto da nossa admiração ou aquelas gravadas na pedra gélida de uma qualquer construção sepulcral?

2007-06-19

Acção vs reacção

Sydney Harris conta a história que presenciou quando acompanhava um amigo até ao quiosque onde habitualmente este comprava o jornal.
O amigo cumprimentou o "ardina" amavelmente, mas em troca recebeu um tratamento rude e mal-educado. Pegou no jornal que foi atirado na sua direção, então sorriu delicadamente e desejou um bom fim de semana!
Quando os dois amigos já desciam a rua, Sydney perguntou:
- "Ele trata-te sempre com tanta má educação?"
- "Sim. Infelizmente é sempre assim..."
- "E tu és sempre tão amável com ele?"
- "Claro!"
- "Porque é que és tão educado com ele, quando ele é tão agressivo contigo?"
- "Porque não permito que ele decida como EU devo agir."

"Engano é tudo o que há no coração dos que só se ocupam em maquinar o mal. Mas há alegria transbordante na vida dos que procuram construir a paz" - Provérbios 12:20

2007-06-18

Investimento reprodutivo

"Abre os olhos e procura um homem ou um trabalho para o bem dos homens, que precise um pouco de tempo, um pouco de amizade, um pouco de simpatia, um pouco de sociabilidade, , um pouco de esforço humano. Procura e vê se não há algum lugar onde possas investir a tua humanidade."
- Albert Schweitzer

2007-06-14

Déficit de exigência

Pela primeira vez estive presente na avaliação final de um "Conselho de Turma". Sem entrar em consideração na postura dos colegas presentes nas várias reuniões, uma característica quase comum veio à superfície: o da benevolência! Mesmo eu, que longe de ser um "mãos largas", quando solicitado a emitir parecer face aos casos mais periclitantes, encontrei-me embuído desse mesmo espírito. Pontualmente, lá ía aparecendo uma voz discordante face à maré displicente de alguns dos docentes, mas (in)justamente marcada tão somente pelos indicadores de comportamento.
Mas então, e a exigência e o rigor? E... o premiar o mérito e penalizar o demérito?
Esta "onda" condescendente é porventura a marca de todo um sistema de ensino, que paulatinamente fenece. Os nossos padrões de exigência estão a diminuir. Ocorre a generalização do sentimento de marasmo, de apatia, de estagnação.
Assim, vamos vivendo a vida. Desejando pouco, procurando nada. Assimilamos o que os outros nos apresentam sem questionar, sem tentar desvendar o significado das coisas, desde que tal ajude à melhoria, ou pelo menos, à manutenção do nosso "status quo".
Amordaçamos a consciência que em vão nos alerta para os perigos dos valores que se perdem, adormecemos o instinto de discernir o bem e o mal... Entramos na onda do facilitismo, da aparente consternação pela inacção dos outros e assim sucumbimos à "obesidade moral" que invade a nossa comunidade.
Estamos "gordos" de conceitos, de definições, metafisicamente super-nutridos, contudo neste processo perdemos o significado da existência humana... a relação com o seu Criador!

"Quanto mais reflectia, tanto mais cresciam as labaredas da agitação em mim. Até que finalmente, falei e supliquei a Deus: 'Senhor ajuda-me a compreender como é curto o meu tempo sobre a Terra, e como eu sou frágil. Aos teus olhos, a minha vida pode medir-se como que a palmos. O tempo da minha existência é como nada para ti. Na verdade o ser humano, por mais bem estabelecido que esteja na vida, é frágil como um sopro. É como uma sombra. Em vão correm atarefados de um lado para o outro, e amontoam fortunas para serem afinal gastas por outros. Assim, Senhor, em quem posso eu esperar? Tu és a minha única esperança'"
- Salmo de David, Tradução "O livro"

2007-06-13

O silêncio desejado

O tempo insinuante e persistente, assume no calcorrear do imenso turbilhão do agir, a sua implacável presença. Quem permitirá opor-se-lhe? Faz-se presente em acções indiferentes e banais, não se furta nas consequentes, está presente nas de evasão e escape. Assim faz prevalecer a sua vontade !


No hiato de silêncio que imperou neste espaço virtual de "pseudo comunicação", semana após semana, mês após mês, a escassez da partilha tornou-se evolutiva e austera, até à completa extinção.


Majestosamente emergiu o império das prioridades reais, o qual facilmente se impôs face às oportunidade virtuais.


Assim o foi! Creio que assim deverá ser, para que no insano artifício verborreico, haja o desejável equilíbrio, e, no discorrer da "tinta" sobre o "papel branco" evidencie-se não uma leviandade discursiva, mas apenas e somente a "impressão" da tradução da existência vivida.


Assim, certamente poder-se-à sempre e em toda a circunstância, prontamente responder à eterna interpelação: "Quo vadis" - onde vais?